Sri Janardana
SAMNYASA
E TYAGA
PRÓLOGO
Dos quatro ensaios que reunimos nesta
publicação, o quarto deles, que trata da meditação, “Dhyana”, é novo, enquanto
que os três primeiros já foram publicados na revista “The Suddha Dharma”.
Contudo, foram feitos alguns acréscimos a estes três para deixá-los em sua
forma atual.
Tampouco é inteiramente novo o quarto ensaio, já que sob a
epígrafe de “Temas do Sanátana Dharma Dípika”, se formou parte de uma versão ao
inglês do original em sânscrito feito por Sri Vasudeva Row.
Neste ensaio, foram
incorporados vários outros detalhes que lhes dão mais amplitude.
O interesse permanente que estes temas
despertam justifica esta publicação, e com maior razão, agora que o mundo
atravessa um período de crise, anunciador do nascimento de uma grande
civilização futura, a Civilização da Síntese.
A separatividade egoísta criada
pelos ensinamentos do passado, em todos os aspectos da vida, está recebendo
agora o golpe decisivo que a deixará fora de ação.
Se se persistisse neste aspecto inservível,
com o propósito de perpetuá-lo por meio da ação, da palavra ou do pensamento,
seguramente se produziriam desastres. Seria isso de índole maligna, tendência
que vai se debilitando cada vez mais.
Qualquer êxito transitório, que esta
tendência consiga alcançar, no presente, é como o resplendor da lâmpada cujo
brilho é mais intenso à medida que se aproxima seu esgotamento.
Para aqueles que creem na síntese, estes
ensaios lhes interessarão, pois oferecem a ajuda necessária para sincronizar a
nossa própria natureza tão diversificada, não só em nós mesmos, mas também em
nossas relações com o mundo exterior, como prelúdio da síntese geral.
A
excelente base desta profunda síntese, a Divindade, não é meramente de forma,
nem imanente nem transcendente, mas estas três simultaneamente A-U-M e, por sua
vez, é inconcebível, O-M.
Por isto mesmo, as formulações feitas pelos diversos
credos existentes são tão-só verdades parciais.
A humanidade atual está
colhendo as consequências de seus apegos a estas meias-verdades.
O primeiro passo do aspirante individualmente
para sua própria realização consiste em integrar todos seus pensamentos,
palavras e atos na Divindade Suprema, pois Dela emanou a totalidade dos fatores
individuais e cósmicos, e nela convergem novamente depois de haver perdurado um
tempo.
Tudo o demais virá ipso facto[1] em
ordem sucessiva por Sua Graça e na plenitude do tempo. Ser indeciso ou duro de
coração em tempos como os atuais é uma demonstração de ignorância, e a
ignorância é a morte. A sabedoria não consiste em nos salvar enquanto os demais
são arruinados; tampouco consiste em se destruir sob a falsa ideia de
sacrifício.
O maior sacrifício, seja qual for a tarefa a que possamos estar
dedicados, consiste na entrega total e incondicional de si mesmo ao ISHWARA, que é o único Refúgio dos
justos e desamparados, e devemos cumprir esta entrega da melhor forma que o
saibamos.
Estes ensaios se baseiam inteiramente nos
ensinamentos dos Suddhacharyas, que
são grandes Yogues, e em sua aplicação subjetiva e objetiva destas verdades, o
autor recebeu a benéfica influência delas. Oferecemos aqui àqueles que buscam
como chegar à Síntese.
Se o crítico é um cultor dos “ismos” e dirige
sua atenção exclusivamente às coisas objetivas e subjetivas, pede-se para que
medite um momento na Fonte Total Única antes de começar a opinar sobre estes
ensaios, pois, do contrário, lhes escaparão das mãos, já que são uma síntese
profunda de tudo; realçamos a
palavra “tudo”. Estes ensaios
tampouco têm o propósito de destacar uma unidade unicamente na diversidade, mas uma unidade com a diversidade.
Não há por que se preocupar com os termos em
sânscrito, já que estes foram explicados amplamente.
O sânscrito, idioma do
Yoga, não tem qualquer preferência pelos “ismos”; Deus, o homem e o universo,
sua íntima relação mútua e o método de adoração não são condicionados por
nenhuma ideia determinada, mas tão-só pela falta de uma compreensão devida.
É a humilde oração do autor que este trabalho
saia ao mundo e cumpra a tarefa a que se destina, entronizando, novamente, no
coração de todos e de cada um, a DIVINDADE, fustigando e expulsando a
separatividade egoísta, ou dushta-ahankara,
que é o mal existente em todo ser humano.
JANÁRDANA
SAMNYASA
E TYAGA
Por Sri Janárdana
Entre o grande número de conceitos yogues que
requerem um acurado estudo e análise, compreensão e aplicação, antes que alguém
possa seguir com êxito o magnífico caminho do Único e Supremo Yoga, o tempo
todo e até seu final, destacamos que Samnyasa e Tyaga exigem a nossa mais
esmerada atenção e estudo, porque são estes os dois agentes vitais e poderosos
cujo auxílio, unicamente, pode tornar possível atingir as alturas celestiais
deste Yoga.
A expressão Yoga Supremo, empregada aqui,
significa, naturalmente, o Adhyatma-Yoga,
ou Suddha Yoga, ou Brahma Yoga, ou Raja Yoga, pois não há outro Yoga superior a este. O ISHWARA encarna periodicamente para
recuperar e restabelecer o conhecimento deste Yoga que se havia perdido.
Não
será demais se recordarmos aqui que este Raja Yoga não tem nada em comum com o
Ashtanga Yoga de Patanjali, ao qual, equivocadamente por não dizer
contrariamente se denominou Raja Yoga.
A finalidade que este Adhyatma Yoga preconiza,
embora seja como ponto de partida das aspirações, é o contato direto com o
Ishwara único no quarto plano de consciência, denominado tecnicamente Turiya, Avyaktam,
o Yogam,
glorificado nas Escrituras com os nomes de Paramatma, Vasudeva, Sat-Chit-Ananda
Rupa.
É este a Origem Única de todas as emanações e processos cósmicos; é ELE quem sustém esses processos e
emanações, e todos estes convergem Nele finalmente.
É uma Unidade Sublime, cuja magnífica
plenitude e riqueza, que a nossa limitada visão apenas é capaz de compreender,
pode ser buscada pelo empenho; pode-se alcançar e vivê-la também nesta nossa existência
diária e tudo isso mediante a simples aplicação dos procedimentos yóguicos que
nos ensina este Raja Yoga.
Nas palavras do Ishwara encarnado, o Senhor Krishna,
a execução e aplicação destas práticas yóguicas, em nossa vida, foi descrita
como “prática sumamente agradável” (susukham kartum).
Samnyasa
e Tyaga são as influências que atuam como
os meios de purificação e sutilização daqueles que estão na senda, para que
possam lograr o êxito desejado com seus empenhos.
Poderemos compreender
perfeitamente que estas influências são também agradáveis, se pudermos nos
livrar das ideias, significados e práticas grotescas que têm brotado ao redor
deles, e se compreendermos o sentido que é dado a estes ensinamentos do Senhor.
Para chegar ao contato com a divindade, no
quarto plano, que é de Plenitude, e não meramente o contato com Seus aspectos
parciais nos planos inferiores, o primeiro princípio deste Yoga consiste em
manter o corpo físico em perfeitas condições, não como um fim em si mesmo, mas
como um meio, já que tão-só com a ajuda do corpo físico será possível chegar a
realizar a aspiração daquele que vai em busca desta finalidade.
Nos Ensinamentos Sagrados (Shrutis), este ato a respeito do corpo
físico, que contém os outros veículos mais sutis, também se considera como um
Yoga (tam yagamiti manyante sthiram indriya dharanam).
E o resultado
natural de tão saudável prática é que promove uma atenção muito cuidadosa com
respeito a toda atividade de pensamento, palavra e ação – tanto para aquilo que
se deve fazer, como daquilo que se há de desistir, de acordo com as normas do
Yoga Superior (apramattastada bhavati yogohi prabhavapyayow).
De modo que, para nos livrar não só da
influência deteriorante da velhice (Jara), à qual o nosso corpo está
destinado, mas também para nos desfazer da ignorância básica que se denomina
morte (mrtyu maranam), óbvia é a importância deste Yoga para aqueles
que são seus aspirantes (jaramaranamokshaya masitya yatanti yo).
Assim, pois, à medida que o nosso progresso
neste Yoga se torna um fato natural de longevidade e, além disso, a
imortalidade, com todos os veículos corporais perfeitamente harmonizados, não
para mero desfrute das coisas dos sentidos (materiais), nem para satisfazer os
afãs egoístas do poder, ou das posses materiais, a fama e os demais benefícios,
que são buscados de maneira irracional e apaixonada, mas para atingir o contato
divino e, com isso, Sua Graça, a fim de que cheguemos a ser Seus veículos fiéis
e adequados para o bem-estar do mundo (lokasangraha).
Sem dúvida alguma, então, se pode assegurar
que a técnica efetiva deste Grande Yoga, em suas etapas superiores, é conhecida
plenamente por Aqueles que já percorreram esta Senda.
Eles constituem uma
legião neste país – Índia -, ainda agora; mas não se encontram disponíveis no
mercado, nem eles ostentam distintivos que possam ser aproveitados para os
nossos propósitos e ambições egocêntricas. Unicamente Eles compreendem
corretamente essa Plenitude que é BRAHM,
tanto no seu aspecto unitário (adhyatma), como na sua múltipla
plenitude, em que o funcionamento de
todos os aspectos e atos prossegue firme e permanentemente (Te
Brahma tadviduhu kritsnadhyatman karma chakhilam), porque a plenitude deve
ser conhecida como Unidade e Multiplicidade como (ekatwena pritaktwena bahuda
viswato mukham). São estas as características dos verdadeiros Yogues,
os Mestres da SUDDHA DHARMA MANDALAM,
que estão sempre trabalhando pelo bem-estar do mundo, em cumprimento do mandato
divino.
Inspirado nos ensinamentos divinos, Eles opinam
que, para atingir o contato com a Divindade e preservar também o corpo em boas
condições de funcionamento, a purificação não é um ato que possa, com toda
comodidade, deixar para a Divindade, como pretende a moderna escola de Yoga
Integral, a qual, sem qualquer justificativa, atribui a si mesma maior
eficiência e poder que o Yoga do Gita; ao contrário, deve-se ansiar pela
purificação e atingi-la pelo empenho pessoal ativo e constante. Esta é a
condição prévia indispensável para que este objetivo possa ser realizado.
Tal
purificação não será obtida pelo aspirante enquanto não tenha aprendido a
criar, gradualmente, em seu organismo Samnyasa
e Tyaga (Samnyasa tyaga suddhireva abhavat).
Na ausência desta purificação, o contato divino é mera ilusão e fantasia.
Portanto, é egoísmo negativo no máximo, mais
temível que o egoísmo positivo, se por nosso livre arbítrio, baseado em um
conceito errôneo do que é a entrega de si mesmo (saranam), resolvermos impulsivamente não efetuar em nós mesmos a
purificação necessária, não obstante a Lei Divina dispor que somente nós
devemos empreender, mas rogamos à Divindade, esperando que Ela nos purifique,
aduzindo ingenuamente que ignoramos até que ponto chega a nossa impureza e
imaginando que podemos estabelecer, ou que temos estabelecido contato com Ela
de algum modo. Acrescenta-se o poder sutil e o domínio frágil dessa ignorância,
se também destacamos e exigimos da Divindade, entre outras exigências, prazo
determinado, esquecendo-se com isso da grande verdade de que o tempo é o
ISHWARA manifestado e que nós jamais podemos transcendê-lo, submetidos como
estamos à sua imperiosa influência (kalohi duratikramaha).
A não ser que
alguém queira enganar-se a si mesmo sobre o ISHWARA, que é o Senhor único do
tempo (Kaloshmi), não podemos dizer de forma prudente que o tempo pode
ser superado, porque isto significa que possuímos a capacidade de contrair ou
prolongar, à vontade, sua duração tal como a conhecemos aqui, e que podemos
fazer com que ocorra algum propósito determinado, seja este o que for, no tempo
que desejamos.
Um pedido feito à Divindade é um pedido feito
ao tempo; contudo, se este propósito, neste caso a purificação, se se deixa nas
mãos da Divindade, quer seja por meio de um pedido, o que significa nos
submeter ao tempo, ou na esperança de que ELA o fará por nós, não obstante Sua
Lei de que nós, e somente nós, o devemos fazer, seria um egoísmo positivo
formular o pedido e isso demonstraria que a entrega de si mesmo é incompleta.
Ignorância será viver esperando, sendo a fase negativa.
Tão-só a combinação
destas duas fases negativas poderia chegar até à arrogância de pretender
transcender a Lei Divina e proclamar, falsamente por certo, um acréscimo ao
Yoga do Gita.
É verdade evidente que o egoísmo, de qualquer
classe, nos leva a uma queda em qualquer assunto, quer seja em questões de comissão[2] ou
de omissão, e em qualquer esfera de ação, quer seja espiritual ou material,
tanto mais o será em relação ao Yoga, que é superior a tudo isto e também sua
síntese. E enquanto permanece o menor vestígio de egoísmo, quer seja velado ou
às claras, a purificação será incompleta.
Em tal caso, jamais se poderá dizer
que se tomou contato com a Divindade como Plenitude, quaisquer que tenham sido
os contatos estabelecidos com alguns de Seus diversos aspectos; e, sendo assim,
o aspirante não poderá chegar a ser um veículo capaz de refletir a Divindade de
maneira fiel e verdadeira; só terá criado um fantasma em si mesmo e nos demais.
Sabe-se muito bem que, com os aspectos
divinos dos planos interiores, que possuem nomes diferentes, é possível tomar
contatos, valendo-se, para isso, de certas práticas de Yoga que possuem um
poder de purificação manifestada menor que o de Samnyasa e Tyaga
explicados no Adhyatma-Yoga. Portanto, uma entrega moderada de si mesmo em
sua modalidade mais primitiva e em cujo ato afrouxa um pouco poder do Eu
egocêntrico, pode atrair a graça divina sem Seu contato visível. Mediante
tortuosos métodos de Yoga parcial (Tapasyas),
certos Asuras do passado, como Hiranya e Ravana, não purificados de seu egoísmo
e apegados em seus desejos, obtiveram os benefícios que ansiavam dos aspectos
parciais do Ishwara.
Assim, pois, mesmo quando os nossos motivos
sejam impessoais e desejosos do bem geral, conforme a nossa ideia do que é o
bem, e ainda que procuremos alcançá-lo por meio do ISWARA ÚNICO que é o mais
elevado que seus aspectos, forçosamente vamos fracassar em obter os excelentes
frutos que nos oferece o Adhyatma-Yoga, se o egoísmo, seja de
que classe for, positivo ou negativo, ainda persistir sem ser eliminado. Este
fracasso se deve a que a entrega de si mesmo não é eficiente e incondicional.
Qualquer glória (ananda), poder e outros
que alguém consiga alcançar neste plano, não ostentará jamais o selo da
perfeição (adhyátmica) mesmo quando puder ser considerado como o maior
valor daqueles que os citados Asuras ansiavam e conseguiram.
É porque, neste
caso, teve-se um conceito maior da Divindade que o deles e, além disso, com um
propósito mais impessoal que o seu.
Por conseguinte, a influência purificadora de
Samnyasa e Tyaga é suprema, pois sua influência e finalidade, sendo dinâmicas,
cada uma possui um poder notável por sua utilidade em todo sentido e, embora
diferentes em seus métodos, complementam-se reciprocamente, induzindo, desta
forma, a atitude de entrega total que facilita a obtenção do resultado
desejado.
A magnitude de sua importância neste Yoga pode ser apreciada na
pergunta de Arjuna ao Senhor, pergunta esta que constitui um resumo, em
brevíssimos termos, para captar a essência dos ensinamentos contidos em Samnyasa e Tyaga.
Unicamente a influência combinada destes dois
poderosos meios poderá desalojar, de seu pináculo, o Eu egocêntrico que provoca
obsessão nos indivíduos em qualquer etapa de sua evolução espiritual ou
material, obrigando-lhes a girar compulsória e eternamente na roda de
nascimentos e mortes, provando, durante a permanência na vida material, os
alternantes frutos de seu apego e aversão, os fatores duais e demais coisas
deste gênero.
Quer seja estar em sua fase negativa de
ignorância, quer seja o baluarte de Tamas, insensível ao saber, embora o
tenha ao seu alcance, aquele que o perverta de acordo com seu próprio capricho,
quer seja estar em sua fase positiva que se arroga a si mesmo “Eu sou o executor, eu sou o desfrutador”
(kartaham
bhoktaham), é da própria natureza do egoísmo, com seu domínio firme
sobre os veículos intelectual, mental e físico do homem, cegá-lo e atá-lo,
acentuando e perpetuando a separatividade em uma ou outra forma, em cujo solo
fértil o egoísmo prospera e se multiplica.
O resultado de tudo isso é que não
se executa aquilo que é necessário que se faça e, ao contrário, o que é
executado é feito com vaidade e apegos.
Este Eu egocêntrico, cujas manifestações
sutis não se podem definir adequadamente quando ele impera, é o evidente
distintivo do incompleto (Asampurna); e cada qual poderá avaliar por si mesmo unicamente mediante uma
auto-análise baseada em dados precisos.
A influência purificadora de Samnyasa é a que auxilia o aspirante a
destruir o sólido muro do egoísmo, em suas variedades diversas, que aprisiona o
Eu do homem, separando-o da Divindade.
Quando se consegue expulsar o egoísmo,
chega-se à inteireza (Sampurnatwan); isto é Brahmatwan, Samatwan,
buscado pelo yogue.
Pode-se dizer, então, que Samnyasa é a força purificadora
negativa e que Tyaga, por outro
lado, é o ato de convergir e sintetizar (upasamhrita) todas as
multiplicidades da Única Causa Total, ou seja, Brahm, e entregar-se
incondicionalmente aos seus Infinitos Poderes (Shákti).
Assim, e somente assim, o Átman do homem, representante de
Brahm, que recebe a entrega, começa a se salvar. Por isto, pode-se dizer que Tyaga é a força purificadora positiva.
Nos livros sagrados (Shrutis) pode-se ver bem que estas influências se seguem uma à outra;
Samnyasa vem primeiro e depois Tyaga. Daí a afirmação de que Samnyasaha
prathamas suddhihi dwitiya tyaga ucchyate.
Com a finalidade de se chegar a uma
compreensão exata do significado destes dois conceitos, será proveitoso
fazermos uma breve recapitulação de seus vínculos históricos.
Pode-se afirmar sobre estas duas forças transformadoras,
Samnyasa e Tyaga, as quais influem poderosamente na formação do homem
integral, que Tyaga assumiu a função
ativa e é indiscutível a importância de sua significação.
Pode-se iniciar com o
ensinamento do Gita de que saranagati,
ou seja, a entrega de si mesmo ao ISHWARA existente em nosso coração e a BRAHM
e sua Shákti (Mamekam) que controlam a totalidade do cosmos, constitui o ato
primordial da aspiração yóguica.
Até a época do GITA, pode-se dizer que Tyaga esteve incorporada no significado
negativo que era atribuído a Samnyasa,
o qual predominava então nos empenhos espirituais; era interpretado
erroneamente como a renúncia a toda atividade objetiva.
Neste país de Samnyasis, somente a palavra renúncia
sugere, de imediato, a visão daquelas pessoas vestidas com mantos laranjas;
entretanto, esse manto, nos dias atuais, em sua maior parte, é só um mero sinal
externo visível e nada mais.
Esta ordem Samnyasa, que é um conceito essencialmente vedantino, é notório que
forma uma parte integral da escola Varnashrama
Dharma, com sua divisão quádrupla da vida do indivíduo, como da sociedade
tomada conjuntamente.
Samnyasa era a quarta etapa
na ordem dos Ashramas dessa escola.
As três etapas anteriores eram: Vanaprastha,
ou do morador do bosque; Grihasta,
ou chefe de família, e Brahmacharya,
o estudante celibatário que estava instruindo-se e adquirindo o conhecimento
dos Vedas e outras ciências, a fim de se capacitar para a vida.
A roupa alaranjada do Samnyasi se supõe indicar ele ter renunciado (e assim o era de
fato) a todo laço mundano, tais como as posses pessoais, suas relações com os
demais, o proveito pessoal no mundo etc.
Tal pessoa era considerada consagrada
exclusivamente àquelas atividades que conduzem à etapa de Moksha, isto é, à liberação da cadeia de nascimento e morte, e esta
é a quarta das finalidades (Purushartas)
do ser humano. Admite-se, também, que essa pessoa já tenha cumprido todos os
deveres correspondentes às três etapas precedentes de sua vida.
Por tudo isto, torna-se evidente que aquele
que se entrega a esta ordem de Samnyasa
do Varnasharama-Dharma tem que ser
uma pessoa de idade avançada, salvo exceções existentes.
Não só isto, deve
estar perfeitamente convencido de sua resolução e há de ter a coragem
suficiente para cortar todos seus vínculos com o mundo.
Tudo isto não se atinge
sem os devidos conhecimentos espirituais.
A descrição que deles se faz nos Shrutis é característica: Vedanta
vignana sunischit arthaha samnyasa yogad yatayaha suddhasatwaha, que se
traduz por: “aqueles de convicção firme por seu conhecimento do Vedanta,
empenha-se em progredir cada vez mais mediante o Samnyasa-Yoga e são de natureza pura.”
Durante seu período de permanência no bosque,
conforme a ordem de Vanaprastashrama,
investigou a fundo até chegar à convicção de que, tal como diz a doutrina
Vedanta, BRAHM é a Causa Universal.
O resultado dessa convicção é que o faz
assumir a ordem de Samnyasa.
Por conseguinte, pode-se considerar a vida de
Samnyasa como de aplicação prática dos princípios e preceitos
aprendidos no transcurso da etapa anterior, a de Vanaprastha; daí que estes são
denominados de buscadores do conhecimento, que constitui a terceira finalidade
(Purusharta), conhecida como Artha,
na qual se procura intensificar a compreensão dos diversos termos e expressões
contidos na citada literatura da Vedanta.
A palavra Vedanta está formada por “Veda” e o
sufixo “anta”, fim; de modo que significa Fim dos Vedas. Isto vem
demonstrar que o motivo do estudo está relacionado com a etapa final alcançada
depois da satisfação plena da vida no mundo.
A maneira como se haverão de
conseguir tais gozos do mundo constitui a maior parte do conteúdo dos Vedas.
Moksha significa término, o
haver completado um determinado ato, ou atos, ou empenhos; portanto, Vedanta é
reconhecido como um tratado sobre Mokshadharma
e se refere exclusivamente à vida espiritual.
Esta Vedanta Vidya, ou Ciência Vedanta, é o conteúdo da maioria dos
Upanishads, tomados conjuntamente.
Os Vanaprastas,
ou Vedantinos, são conhecidos também pelos nomes de Sankhyas, ou Karana-vignanis
(conhecedores da Causa); eles discernem qual é o aspecto causal de Brahm.
A palavra Sankya significa números, ou seja, aquilo que é múltiplo. Aqueles
que ostentam este nome analisam a variada multiplicidade do mundo, usando o
silogismo e a lógica, para chegar à conclusão de que BRAHM é a Causa Universal.
Entretanto, ocorre que em tais raciocínios é inevitável que as premissas
sugiram uma dualidade; resultado disto é que se tem produzido, gradualmente,
uma completa separação entre a Causa Universal, BRAHM, e o Mundo, chegando a
considerá-los como duas entidades absolutamente distintas, sem relação alguma
entre elas.
A consequência disto, os esforços espirituais e mundanos também se
separaram, alegando-se aquilo de que “BRAHM é verdade e o mundo é falso” (Brahman
satyam Jagat mitya), frase esta que se encontra em alguns dos
Upanishads. Cabe advertir, contudo, que a palavra mitya nesta sentença, não
pretende negar a realidade concreta do mundo, mas busca educar a mente do
homem, a fim de que não se apegue em demasia às coisas que o mundo contém.
Apesar disto, nas escolas Vedantas surgidas
posteriormente, por exemplo, a Adwaita, se apossaram firmemente desta
ideia sobre a falsidade do mundo (Mitya-Vada),
a qual se constituiu no fundamento de sua doutrina, junto aos dez Upanishads
selecionados aleatoriamente entre cento e oito, ou um mil cento e oitenta,
segundo outros cálculos. Insistiram firmemente que estes dez Upanishads
bastavam para Brahm-vichara,
omitindo-se os demais, não obstante conterem um vasto tesouro de conhecimentos.
Preconizou-se a renúncia total ao mundo como um fim em si mesmo, com todo zelo
e decisão.
Desta maneira, abriu-se a ordem de Samnyasa a todos por igual, qualquer que seja a idade, ou seja,
justamente o contrário do costume anterior; agora, só se exige possuírem as
condições necessárias. Deste modo, foi como Samnyasa degenerou, pouco a pouco, tornando-se um sistema
especulativo carente de realizações. Depois passou a ser um recurso para
néscios ociosos, e, ultimamente, tem sido refúgio contra o problema da
desocupação. Certamente, há exceções.
Esta modalidade de investigação Vedanta, que
tem predominado e é o que se estuda ao se adotar a ordem de Samnyasa, a qualquer idade e sem nenhum
merecimento, não foi jamais o que conceberam os criadores do Ashrama-dharma, no qual a qualificação
e a idade eram os requisitos para poder ingressar na ordem. Resultado deste Samnyasa indiscriminado tem sido o
desmazelo completo no estudo no estudo dos Vedas, apesar deste estudo ter sido
obrigatório para a juventude durante sua etapa de Brahmacharya, da qual se afirmava que se estava empenhado em
alcançar a primeira das quatro finalidades (Purushartas), ou seja, o Dharma.
Não obstante tudo isto, pode-se julgar
favoravelmente o fato de se haver deixado o estudo dos Vedas, já que isto é
parte do plano divino, condenados como foram os Vedas de influência qualitativa
(Trigunas) pelo Gitacharya.
Os Grihastas,
ou chefes de família, se empenhavam em alcançar o segundo dos Purushartas,
denominado Kama, o qual se refere
aos prazeres da vida, atuando sob a influência dos Vedas, se entregaram, sem
restrição alguma, à prática de sacrifícios (Yagnas), para invocar as divindades como Mitra, Varuna, Indra etc.;
também a intermináveis ritos, a fim de atingir seus propósitos nesta vida,
alcançar também o Céu (Swarga) e
ocupar uma situação como a de Indra nos outros mundos depois da morte.
Os meios para a obtenção de tais objetivos
formavam a parte principal destes Vedas, a tal extremo que seu estudo despertou
verdadeira sede por eles.
Como resultado, Mukti,
ainda tem feito bastante dano sob outros aspectos, levando-nos à nossa condição
atual.
Seria conveniente dizer algo aqui acerca do
aspecto Varna segundo a escola Varnashrama original do Vedanta.
Isto se justifica porque está estreitamente vinculado à Ordem Ashrama.
Em seu sentido literal, Varna significa cor, mas
é empregado para nos sugerir a ideia do trabalho que alguém está executando.
O trabalho se classifica em quatro divisões.
Primeiro vinha o trabalho do Brahmana, depois o do Kshatriya,
seguia o Vaishya e, finalmente, o Sudra. Mais tarde, esta divisão se
cristalizou na agrupação por comunidades, que desempenhavam determinadas
ocupações assinaladas por seus nomes; finalmente, degenerou, atribuindo-se-lhe
o significado de linhagem ou classe social. Entretanto, não foi assim em sua
origem, pois correspondia à quádrupla divisão da Ordem Ashrama a que já nos referimos.
Desta forma, na palavra Varnashrama,
a ashrama respectiva indica a etapa
em que o indivíduo se encontra em determinado período de sua vida, e Varna denota a ocupação a que encontra.
Na primeira etapa, a da Brahmacharya, a ocupação consistia em Bramana-Dharma,
vale dizer, a aquisição de conhecimentos sobre a vida em todas as suas fases.
Na etapa Grihasta, afirmava-se que se estava
cumprindo o trabalho de Kshatriya-dharma relacionado com o
desempenho dos deveres familiares, os quais se exigiam administrar muitos
golpes usando robusta musculatura.
Já como Vanaprastha, seria um Vaishya
que adquiria a riqueza, não de posses materiais, mas dos conhecimentos
espirituais superiores.
Na condição de Samnyasa, estava entregue aos trabalhos de Sudra-Dharma, fazendo uso prático dos conhecimentos adquiridos na
etapa anterior e prestando serviços impessoalmente.
Desta maneira, os três veículos principais do
homem: intelecto, mente emocional e órgãos dos sentidos, se exercitavam
plenamente; o primeiro deles, nos dias de estudante; o segundo, quando era
chefe de família e habitante do bosque; e o terceiro, durante sua vida de Samnyasi.
O trabalho prático de Samnyasi não consistia na execução de algum trabalho manual, mas na
purificação e abrandamento dos órgãos dos sentidos e em estabelecer o domínio
sobre a persistente tendência destes à exteriorização. Para isto, recolhia-se
dentro de si mesmo (Dustendriya vigrimbana vijaypradam samnyasam).
Era este seu
trabalho, Karma, e, à medida que
progredia, conseguia aniquilar seu Eu egocêntrico, a impureza raiz, o qual
atingido estabelecia sua união (Yoga)
com a Divindade.
Esta é a razão pela qual, na literatura Vedanta original, se
declarava que o Samnyasi é um Karma-Yogue. Não nos interessa o nome
pelo qual tenha sido designado posteriormente.
Este trabalho de Karma-Yoga do Samnyasi
é, portanto, distinto do trabalho (Karma)
do chefe de família, porque este, auxiliado pelos Deuses, cujos aspectos ele
invoca, se ocupa em dar livre jogo aos seus sentidos e impulsos egoístas.
A purificação dos sentidos, praticada pelo
autêntico Samnyasi, se levava a
efeito de acordo com a conhecida regra de Sadhana-chatustaya,
que é a prática quádrupla para atingir a Mukti
e também para a união (Yoga) da alma
individual (Jivatma) com a Alma Universal
(Paramatma).[3]
Este processo em conjunto se denomina Samnyasa Yoga, mencionado nos
Upanishads.
Esta regra de Sadhana-chatustaya foi a que mais tarde deu origem a esta
diversidade de escolas de Yoga que se chamam de Hatha Yoga, Ashtanga Yoga, Laya
Yoga, variadas técnicas tântricas e outros do mesmo estilo.
Algumas destas escolas degeneraram em
exercícios torturantes, aniquiladores do corpo e em atos duros e cruéis karsyanta
sarirastam bhuda gramam achetasaha como o Gita os descreve. Isto talvez
se devesse a uma equivocada ideia sobre a purificação do corpo, ou ainda fosse
o meio de atingir seus objetivos de paixão.
O resultado foi uma divergência entre estas
escolas de Yoga e a Vedanta; e ante o fato de que nas escolas Vedantas atuais
se omitiram dos seus preceitos muito significativamente a palavra Yoga; é
evidente que para estas se dirigem unicamente com o objetivo de se adquirirem
poderes (Siddhis).
Estas escolas
Vedantas sustentam que Gnana, mera
compreensão intelectual para elas, é o supremo
e um fim em si mesmo para se chegar à Mukti. Isto se fundamenta em que, mediante tal conhecimento, se
toma contato com a Divindade. O que ocorre é que seu mais elevado conceito da
Divindade é Nirguna e a este se tem
dado, equivocadamente, o significado de “sem forma”.
Esta ideia deu origem a outras escolas de
Vedanta. Algumas delas afirmam que a devoção (Bhakti), é suprema; esta é a escola Visishtaidwaita.
Outra escola, da Dwaita, ou dualista, jurava que os atos (Karmas) tais como a adoração ritual (pujas), os votos (vratas)
e os banhos sagrados são, por si sós, de máxima eficiência.
O mais elevado conceito que estas duas
escolas têm de Deus é o de Saguna,
ou seja, com forma (exemplo Vishnu).
Porém, este culto a Vishnu fez impacto na
primeira escola, a Visishtaidwaita,
que preferiu o culto a Shiva. E, desta forma, tem sido toda esta diversidade.
Não foi isto o que a escola Vedanta original
havia concebido.
Pode-se provar claramente o fato de que, das duas divisões
principais, que orientavam a vida naqueles tempos, por uma parte Brahmacharya, Grihasta e Vanaprasta e,
por outra Samnyasa e o que segue, a
primeira destas duas divisões era para atingir os frutos da vida no mundo,
adorando a Deus com forma, chame-se a isto Saguna
ou como se queira agora; enquanto que na segunda, começando por Samnyasa, o motivo da realização
constituía o aspecto Nirguna.
Veremos mais adiante o que realmente
significa Nirguna; em todo caso, jamais
significou “sem forma”.
De acordo com os progressos alcançados pelos Samnyasis em suas práticas, se lhes
classificava antigamente em seis categorias diferentes.
As quatro primeiras
constituíam uma só classe, as duas últimas não.
As quatro primeiras eram denominadas Atmiyas (Espiritualistas),
significando, com isso que estavam empenhados à investigação Átmica (espiritual), da variedade Sankya (analítica).
Este nome de Atmiyas os diferenciava dos que viviam
sua vida mundana e são chamados Prakritas
(materialistas).
Dessas primeiras quatro categorias de Samnyasis, vinha, em primeiro lugar o Kutichaka, aquela pessoa que vive em
uma ermida praticando; depois vinha o Paravrajaka,
ou caminhante sem lar; dedicado à instrução do povo; em seguida, a categoria de
Hamsa, do qual se afirma que atingiu
a perfeita discriminação entre o verdadeiro e o falso; sabe-se, além disso, que
o Samnyasi desta categoria procura deixar fora de combate o Eu
egocêntrico, recitando, para isso, a famosa f´órmula “Hamsa soham Hamsaha” – “Brahm sou eu, eu sou Brahm”.
Na categoria seguinte, a Paramahamsa, se diz que, como resultado de haver aniquilado o
citado Eu egocêntrico, atinge o contato com a Divindade em seu aspecto Nirguna, ou Átman, e permanece
imaculado e desligado de toda atividade materialista ou mundana. Este Átman
está livre das qualidades (gunatita)
e é mera testemunha de tudo; está entronizado no coração de cada um (ishwara
sarvabhutanam hriddese ati tishthati). Sabemos pelos Upanishads que é
do tamanho de um dedo polegar (angushta matra purusha).
Denomina-se esta realização de contato Nirguna; é a culminação do Karma-Yogam do Samnyasi, porque, nas etapas anteriores, ele já havia tomado
contato com os outros aspectos Akshara
e Jivatma, da Divindade.
A obtenção deste plano Nirguna é o que se
denomina ter alcançado o Adhistana
ou Paramstana mencionado no GITA (Yogui
param sthanamupidi chadyam).
Quando chegou até aqui, afirma-se que ele
é um Mukta, ou seja, o que se
liberou da não ilusória obrigação de seguir na existência cíclica.
Assim é que se justifica seu título de Yogue
(Yogaruda), porque,
anteriormente, este era um nome de favor que se outorgava porque se encontrava
na tarefa (Karma) de ascender os
degraus do Yoga (Arurukshu).
Também lhe é conferido o nome de Vijayi
para destacar que conquistou a morte, e se diz que ele está liberado da ação,
ou seja, que alcançou a liberdade (Swatantra).
As duas categorias finais do Samnyasi são Turiyatita e Abadhuta. A primeira das duas significa transcender ao
quarto plano (Avyaktam) de
realização; a outra denota nudez, porém, neste caso, esta não se refere à
roupa, mas destaca a plena liberdade do Princípio Vital para tomar o corpo e deixá-lo
à sua inteira vontade.
Pode-se dizer que estas duas categorias
finais têm relação com a adoração do aspecto Suddha da Divindade, que é o Paramatma,
denominado Suddhatman, nos Upanishads,
e capacitam o aspirante para ocupar cargos na Hierarquia que executa o Plano
Divino da evolução mundial.
Sobre isto, podem-se conhecer detalhes na
literatura Suddha. Diremos que o Regente Oficial desta Hierarquia é Bhagavan
Sri Naráyana; encontra-se na região de Badári, nos Himalaias, e é o
representante direto do Suddha-Paramatma.
Afirma-se, ainda, que se desenvolvem vários
poderes (Shaktis) durante
estas práticas para elevar a consciência (Kosha
sankramanam) nos corpos ou envolturas, a fim de chegar ao plano Nirguna.
Esses poderes são a
demonstração externa do desenvolvimento interno atingido. Contudo, a
preocupação constante do Vedanta é não se deixar aprisionar pela influência
destes poderes, nem obter lucro por meio deles.
Esta preocupação é produto do
medo ocasionado pelo fato de que o egocentrismo persiste até o último, porque
não foi eliminado antes.
Na literatura Suddha, a aspiração a estes
poderes é uma norma estabelecida, porque, de início, a prática se inicia por
eliminar tal egoísmo, ainda em plena vida ativa, a fim de que esses poderes,
gerados de forma pura, podem ser usados pelo bem da humanidade (Lokasangraha).
Estima-se que, deste modo, o Samnyasi, ou Karma-Yogue, terá destruído os
efeitos acumulados de suas ações passadas (sanchita-karma), também a semente de
futura reencarnação (agami-karma), e que ele está
dedicado unicamente a viver até seu término o prarabda-karma que foi a
causa pela qual tomou seu corpo e sobre o qual não tinha controle algum.
Mediante suas práticas, este Samnyasi
conseguiu anular os efeitos das ações que causam a reencarnação; por este
motivo, se diz dele que alcançou o estado de “inação” (Naishkarmya-siddhi).
Esta
ideia da inação alcançada pelo Samnyasi teve um efeito negativo que, pouco a
pouco, se impôs. Justificando-se que o Samnyasi não age, se foi gradualmente
abandonando a execução de todo trabalho relacionado com o mundo, qualquer que fosse,
quer seja deixando de iniciar atividade alguma aqui ou abandonando, sem atenção
alguma, todo trabalho, por inconcluso que estivesse, a fim de assumir o rol de Samnyasi. Isto se deveu a que houve
crença errada de que, se se adotasse a atitude de Samnyasa, em qualquer oportunidade e se renunciasse a toda ação no
mundo, se atingiria o Naishkarmya-siddhi,
para terminar em Moksha (liberação).
Foi assim que se chegou a crer que Samnyasa
significa renunciar a ação.
A prática seguida pela escola Sankya do Vedanta para chegar a ser Mukti e atingir o contato divino, ou
união (Yoga), com Nirguna, por meio de Naishkarmya-siddhi,
se iniciava com a aquisição do conhecimento de Brahm (Gnana), depois com a fé e
a firmeza de prosseguir (Bhakti) e, finalmente, a continuação efetiva (Karma).
A isto, o Senhor denominou, com toda precisão Gnanayogena Sankhyanam. Contudo, a esta escola Sankya se considera Vishama,
a causa de seu postulado inicial de uma dualidade: BRAHM e Jagat[4]
como dois aspectos diferentes, sem relação, e que para alcançar BRAHM é
necessário renunciar ao mundo.
Arjuna também esteve assediado por esta mesma
crença, quando desejou desistir do combate, não obstante sua plena justiça,
para se dedicar aos objetivos espirituais, inspirado nas ideias equivocadas de Naishkarmya-siddhi e Samnyasa que eram então a ordem do
dia.
Para desalojar da mente de Arjuna toda ideia
acerca de uma dualidade contraposta (dwanda-moha),
seja de pensamento, palavra ou ação, que é o resultado do egocentrismo impuro e
pessoal, o Senhor deu-lhe seu ensinamento sublime; indicou que se deve seguir o
caminho dos Yogues na execução de todo ato e que devemos cumpri-los de acordo
com a nossa natureza e em conformidade ao mandato divino, durante a nossa
permanência no mundo.
Este é somente a vestimenta da Divindade, Brahm, no qual
Ele opera. Atuando assim, devemos entregar-lhe os frutos dessas ações e nos
entregar a nós mesmos, por inteiro e incondicionalmente; deste modo, é como
conseguiremos nos liberar e atingiremos o mais elevado contato com a Divindade.
É bem notório que, apesar deste sublime
ensinamento, as escolas Vedantas dos últimos tempos têm persistido em sua
interpretação equivocada de Samnyasa
como renúncia a toda ação no mundo, com distinção à sua preferência por Gnana, Bhákti e Karma, esquecendo-se que, para alcançar o objetivo, é
indispensável a síntese de tudo isto. Também, têm havido intermináveis
conflitos religiosos.
Entretanto, o público em geral, sobre o qual se ressaltam
estas coisas, abandonou-se a um estado de letargia e indolência, terminando por
se converter em servos.
Sem qualquer dúvida, pode-se asseverar que a
interpretação do Karma-Yoga,
formulada por aquele que se autodenominou Lokamaya Bala Gangadar Tilak, embora
seja apenas em parte a verdade a respeito do GITA, ao que tem sido interpretado
pelas três escolas Vedantas, de acordo com suas próprias ideologias, conseguiu-se
deter a deteriorante influência tamásica que havia se apoderado da Índia
durante muitos séculos e cujo resultado é a situação precária em que agora nos
encontramos.
Com o Senhor encarnado, Bhagavan Sri Mitra Deva, a mudança que se
destacou, de acordo com o plano divino, e, seguramente, será impulsionada com
viva decisão para o seu objetivo.
Na terceira parte deste ensaio, veremos o que
o GITA diz a respeito de Samnyasa e Tyaga, e também, embora sucintamente,
sobre a natureza da Divindade.
Quando o Senhor exortou Arjuna a tornar-se
Yogue e que combatesse, qualificativo este de toda ação em geral, empregou a expressão Karmayogena Yoguinam.
O Karma-Yoga destacado pelo Senhor não era o
da Ordem Samnyasa que somente se
ocupa de questões subjetivas e acordo com o Vishama-Sankya da Escola Vedanta; ao contrário, referia-se a este
tipo de Karma-Yoga que os Yogues antigos cumpriam (Kuru karma twam purvihi
purvataram).
Esses eram Adhyatma Yogues e,
contudo, participavam do mundo. Como o faziam? Eles atuavam sobre a base de Samatwa ou Brahmatwa, que é Yoga (samatwan
Yoga uchyate).
Para atuar assim, se requeria, certamente, um conhecimento
prévio de Sama e Samatwa.
Todo conhecimento, seja teórico ou prático, a
respeito de qualquer coisa é Sankhya,
a causa da análise que se requer para atingi-lo.
O conhecimento é Vishamma-Sankhya quando carece de toda base sintética; por exemplo,
aquele de que BRAHM e o mundo são diferentes, o mesmo para todas as dualidades
semelhantes.
O conhecimento é Sama-Sankhya quando se baseia na síntese. Esta base sintética é
BRAHM, cuja vestimenta é o mundo. Aqui, o citado BRAHM opera com uma tríplice
capacidade: como Princípio Vital (Átman),
como Matéria (Prakriti) e como Força
ou Energia (Shákti). Afirma-se que o
homem é composto destes três; seu conhecimento detalhado constitui o estudo de Gáyatri-Dharma.
Portanto, enquanto Vishmma-Sankhya conduz os homens à separatividade, Sama-Sankhya os conduz ao Yoga, ou
União.
O Yoga é, em si mesmo, uma aplicação desse conhecimento de Sama-Sankhya.
Sabe-se muito bem que somente a teoria a
respeito de qualquer coisa é inútil sem a prática, e vice-versa; mas nada
poderá ser realizado devidamente sem os conhecimentos corretos. De todos os
conhecimentos, o sintético é o supremo, porque facilita o funcionamento
sintético, que é excelente e o melhor de todos (Yogaha karmasu kouchlam).
A consequência desta intimidade plena de Sankhya e Yoga se declara praticamente ser uma só coisa (Ekam samkhyamcha yogamcha).
O GITA é venerado e aclamado como um
tratado sobre Yoga Brahma Vidya pelo
fato de que é uma exposição completa de tudo o que se refere a Brahm e sua
relação com o mundo e, por suas explicações de como são possibilitadas todas as
realizações Espirituais, Mundanas e Superiores, por meio de Sankhya e Yoga.
Na expressão Karmayogena Yoginam, há uma diferença vital entre este Karma-Yoga
dos Yogues apoiado em Samatwa, e o
Karma-Yoga dos partidários da escola Vedanta, que é Vishamma-Sankhya. A diferença consiste em que, enquanto estes
últimos dão aos seus objetivos espirituais um caráter abstrato, que se opõe aos
empenhos objetivos, e se dedicam exclusivamente a práticas subjetivas, os
Yogues, coordenando na síntese que “Tudo é Brahm, tudo é de Sua natureza e tudo
é necessário”, se ocupam aqui em atuar sinteticamente, com amor e devoção
sintéticos e com conhecimento sintético, antes de passar aos planos
superiores de Yoga.
Ambas as escolas reconhecem que Samnyasa é uma atitude necessária em todo Yoga , posto que é Karma-Yoga.
A respeito disto, o GITA também diz: Yam
samnyamidi prahuhu yogam tam viddhi. Porém, assim como no Sankhya do
Vedanta, ou Vishama-Sankhya, o
estado Samnyasa é a culminação da
vida no mundo, no Sankhya do GITA, ou Sama-Sankhya,
é o ponto de partida nesta vida.
Os ensinamentos contidos no GITA foram dados
precisamente para destruir a tendência separatista da escola Vedanta e inculcar
a ideia da Unidade Yogue que deve existir entre os empenhos de ordem espiritual
e os temporais.
Já vimos que Samnyasa é necessário para que se possa alcançar o fruto máximo do
Karma-Yoga Vedanta, ou seja, conseguir tomar contato com a Divindade como Nirguna.
Esta frutificação é o
resultado de haver eliminado os conceitos de iniciativa egocêntrica existente
no Eu egoísta. Esta impureza, que jazia na mente deste tipo de Samnyasi, foi a
que impeliu a renunciar anteriormente a todo ato no mundo, por considerá-lo
como uma coisa separada. A eliminação dessa impureza constituiu seu último ato;
ela provinha de uma errônea interpretação e uma aplicação equivocada da ideia
de Naishkarmya-siddhi.
O Samnyasa
do tipo Sama-Sankhya do GITA
consiste na renúncia a tal Eu egocêntrico em todas as esferas de ação
intelectual, mental e física, e este é o primeiro passo absoluto; não é a mera
renúncia à ação física como se fosse isto o único de Samnyasa. Esta renúncia só é possível de ser cumprida com êxito se
se exclui toda classe de ideias de dualidade contraposta, sintetizando-a
mediante o Yoga no BRAHM único e não
pela mera adoção da ordem Samnyasa (samnyasatu mahabado dukkam aptum ayogataha).
Somente é um Samnyasi, no verdadeiro sentido da palavra, aquele que completou
assim a conquista do Eu separatista, não importa qual seja sua vida, porque ele
não ambiciona os frutos para si mesmo, nem para seu grupo restrito (anasrita
karma phalam karyam karma karoti yaha sa yogui), nem concebe a ideia de
que tal ou qual coisa é boa para ele ou para todos em geral (sarvasankhalpa samnyasi) já que
unicamente procura alcançar o êxito no Yoga (Yogaruda).
Chegar a ser um Samnyasi no verdadeiro sentido
da palavra é o resultado pleno de haver sintetizado na Unidade os opostos de
pensamento, palavra e ação, porque se renunciou ao seu Eu egocêntrico.
Atinge-se com isto um intelecto desapegado (asaktabuddhi), a conquista sobre as aberrações da mente emocional (Jitatma) e a liberação do apego (vigataspruhaha), com o qual se liberta
de toda ação (Naishkarmya Siddhi) Asakta
buddhihi sarvatra jitatma vigataspruhaha Naishkarmya siddhim paramam Samnyasena
adigacchati.
Não se alcança esta dependência somente em se
negar a iniciar qualquer trabalho (Na karmana anarambat naishkarmyam
purushosnute), nem tampouco renunciando à ação que deve ser executada (nacha
sanya sanadeva); consegue-se isto eliminando as predileções pessoais do
Eu impuro e egoísta em toda ação (yasha naham krito bhavo), de modo
que qualquer ato que se execute ou que se desista, afirma-se que ninguém não
atua mesmo quando o faça de maneira excelente.
Para chegar a conseguir esta atitude mental
para toda ação, é óbvio que se deve compreender corretamente a base sintética
de todas as manifestações duais; igualmente, há de se estudar e aprender qual é
a determinada situação e composição essencial de tais qualidades no mundo e em
nosso próprio corpo; isto como primeiro passo, já que estes aspectos constituem
o conhecimento real e verdadeiro (Sama-Gnana)
– adhyatmagnana
nityatwam tatwagnanarthadharsanam.
Daí provém a alusão do Senhor aos Gnanis e Tatwadarsis (Gnaninaha
tatwadarsinaha), que são os conhecedores da teoria e prática da aproximação
a BRAHM, tanto em sua manifestação unitária como em Suas manifestações
múltiplas.
Assim como Samnyasa é o dispensador do ego de separatividade no homem, Tyaga é o que unifica as
multiplicidades no Brahm Único – (Ekam)
e em Seu Poder
(Shákti); à medida que progride esta
realização, aumenta em amplitude a entrega de si mesmo, sendo o primeiro de tudo
a entrega ao ISHWARA, em nosso próprio coração.
A natureza dos diversos aspectos deste
ISHWARA Único que reside dentro e fora está condicionado pela natureza de sua
energia (Shákti) com a qual está
associado e pela natureza da Matéria (Prakriti),
na qual atua em determinado momento. É assim como se diferenciam, em
progressiva ascendência, os diversos aspectos do ISHWARA realizados pelo Karma-Yogue, Bhakti-Yogue e Gnana-Yogue,
até que, finalmente, o Atma-Yogue
atinge, no plano Turiya (o quarto),
o contato pleno com a Divindade, o Paramatma
eternamente em Yoga.
É este o único Ator, Desfrutador, Criador, Sustentador,
Reintegrador e tudo; nós somos meros agentes.
Mas como nós não vamos percebendo
deste progressivamente, o torvelinho do processo evolutivo mundial nos arrasta
fatalmente.
Mediante Samnyasa
e Tyaga, também se atingem outros
aspectos mais elevados de Yoga que sobrepassam ao Sat-Chit-Ananda, ou seja, o Purusha.
Tudo isto nos demonstra quão importantes são Samnyasa e Tyaga, não só nas etapas superiores do Yoga, como também para
ganhar os excelentes frutos desta vida na medida em que os tenhamos aplicado.
No GITA, se descreve, com as palavras
seguintes, a natureza do Karma-Yogue que desenvolveu Samnyasa e Tyaga
plenamente: Yatswabhavatmatatvagnihi karanihi upalakshyate anadimadhyanidana
soantarami saswataha, que se traduz por: “Eu, o Morador Interno, sem
origem, meio nem fim, sou o que discernem os Karma-Yogues como o Princípio de
associação Átmica (espiritual) com
Prakriti (matéria), em termos de causas e efeitos.”
O Karma-Yogue adora nisto ao ISWARA como Antaryami, o Sutratma, ou seja, Imanência, qual o fio das contas (sutre maniganaiva), interno e externo,
expresso como as cinco causas que governam o mundo e o homem.
Estas cinco causas são: Adhistana (mundo ou corpo), Karta
(o aspirante fervoroso), Karanam
(meios ou conhecimentos), Chesta
(execução) e Deiva (o ISWARA ou
Causa Geral).
Eles constituem BRAHM, Causa Total, e, de acordo com suas
diversas formações, dão por resultado as bênçãos brâhmicas desejadas.
No GITA são mencionados estes cinco aspectos
no versículo que diz “Adhishtanam tada karta karanam cha
pritharkvidham vividhasha pritakchesta daivam chivatra panchanam.
Destes cinco, Deivam é o aspecto
átimico (espiritual), da Causa Brâhmica, e Adhishtana
é o aspecto prakrita (material),
enquanto que os outros três, Karanam, Karta
e Cheshta, são seu aspecto shákti (energia) e denotam,
respectivamente, Conhecimento (Gnana),
Desejo (Iccha), e Ação (Kriya), que se põem em jogo por
consequência da interação de Atma e Prakriti (Espírito e Matéria).
Karta, ou o atuante, se
equipara a Iccha (desejo ou vontade)
em vista do fato de que todo ser individual é primariamente uma energia-desejo,
ou, como queira, um desejo ativo.
A combinação destes cinco fatores da Causa
Total Única que é BRAHM, simbolizado como OMKARA
e representado em Seu aspecto trino – (Vasustriya)
de A-U-M, constitui o mundo manifestado com todo seu conteúdo e seus variados
processos evolutivos (Samsara).
De modo que se compreende claramente que tudo
o que ocorre no mundo, seja isso justo ou eqüitativo, ou o contrário, estes
cinco fatores conjuntamente trazem o resultado (Nyayyam va viparitam va panchita
tasya ketavaha).
Em consequência, é uma ignorância grosseira e desconhecimento da
verdade alegar a exclusividade da Causa Espiritual (Atman) e amparar-se nisso quando se deve atuar no mundo com um
determinado propósito (Tatrivam sati kartaram atmanam kevalam ta
yaha pasyatyakritabuddhitvanna sa pasyati durmatihi). É como invocar o
direito à indolência.
O Karma-Yogue, purificado pelo Samnyasa e Tyaga, que dominou o funcionamento destas cinco causas, alcança a
liberdade (“Swatantra”), se
desempenha em atividades apropriadas a ele, de conformidade com o tempo e
lugar, e dedica os frutos de seus atos e a si mesmo ao ISWARA, Causa Geral.
Para ele, é uma realidade viva o contato divino.
O representante objetivo da Divindade é
Bhagavan Sri Naráyana, em Badári, que permanece em sua agradável forma feita de
Deivi-Prakriti,
dirigindo o governo deste mundo tal qual o faz o Paramatma, o ISWARA de todo o cosmos; portanto, nada do que ocorre
neste mundo escapa de Sua atenção. O Yogues, Gnanis, Devotos e os Grandes Seres
da SUDDHA DHARMA MANDALAM oferecem adoração somente a ELE e Dele recebem sua
inspiração no desempenho de suas funções; estas, como é óbvio, se sobressaem
por sua excelência, já que têm a Direção Divina.
Este Karma-Yoga constitui o fundamento
básico para os domínios superiores do Adhyatma-Yoga, aos quais se chega na
plenitude do tempo, depois que se tenha dado conta de que já se completou os
deveres aqui, neste plano evolutivo do mundo.